quinta-feira, 7 de maio de 2015

A dor da infância

Literatura se faz com talento e sensibilidade. Talento para transmitir ideias e sensibilidade para capturar a complexidade do ser humano. Poucos autores realizam essa tarefa com a competência de Bartolomeu Campos de Queirós. Ele nos encanta, ainda, pela abordagem de sua própria vida, que transforma em prosa poética. Não é um escritor infantojuvenil, como costumam rotulá-lo. Nada disso. Talvez ele fale à criança que ainda habita em nós. Criança que talvez carregue memórias dolorosas da infância, com frequência obrigada a crescer à força e na marra, empurrada pela vida.
          Prova disso é seu livro Vermelho Amargo. Nele, vemos o menino sensível e observador retraçar os passos da paixão de uma família cuja mãe foi substituída por uma madrasta que possui ingredientes de conto de fadas: ela distribui pouco amor, pouco carinho, pouca atenção e até pouca comida. Um simples tomate sintetiza, com dramaticidade, a dor da perda. O pai alcoólatra pouco contribui para minorar a falta. Vermelho Amargo tem gosto de pouco, de falta.
          A dor profunda se mistura à memória numa linguagem que executa verdadeira sinfonia à língua portuguesa, à palavra precisa, à reflexão intensa. Tudo isso em setenta páginas de texto.
          Vermelho Amargo fala direto ao coração. E faz sashimi desse coração com uma faca de gume afiado, pronta para cortar fundo cada fibra de nossa sensibilidade. E serve o prato ainda com o sangue da memória bem quente, bem líquido, a escorrer diante dos olhos.        



2 comentários:

France Gripp disse...

Bonito comentário! O livro de Bartolomeu é belo e triste!

BlogdoLuísGiffoni disse...

Concordo com você, Francirene. Obrigado pela leitura. Abs