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Blog do Luís Giffoni
Crônicas, viagens, aventuras, reflexões
sexta-feira, 21 de agosto de 2015
quarta-feira, 19 de agosto de 2015
PAIXÃO DOENTIA
O que é a paixão? Uma fera solta na
selva da vida que devemos enfrentar com unhas, dentes e riscos? Ou negar a paixão seria a grande isca para a fúria do animal selvagem que habita
o fundo da alma humana?
Henry James, escritor norte-americano que se tornou
inglês vitoriano, trabalha essas questões em sua novela de oitenta páginas A Fera na Selva. E, em tão curto espaço, deixa-me perplexo com
sua intuição, talento, capacidade criadora, além da profunda análise
psicológica que antecipa e ultrapassa Freud.
A
Fera na Selva é um mergulho na complexidade da consciência que foge a
regras, estudos e convenções. Trata do relacionamento de John Marcher e May
Bartram, um casal inglês marcado desde a juventude pela impressão de que algo
raro e estranho, ao mesmo tempo prodigioso e terrível, aconteceria a John, e
ambos transformam essa premonição em motivação para a vida. Aguardar o evento
extraordinário, que aparentemente nunca chega, marca o relacionamento de John e
May. Esperam Godot com meio século de antecedência.
John é extremamente egoísta. Ela se mostra algo simplória, porém, ao final da vida, atina que o grande evento
havia ocorrido e reza para que o companheiro não o descubra, pois a revelação
lhe abalaria a sanidade. Ao lado do túmulo de May, John acaba inferindo a
verdade, final e absoluta: o vazio. Com esse enredo, singelo à primeira vista,
Henry James tece uma trama envolvente, refinada, perspicaz, densa, que prende a
atenção.
Deve-se viver ou evitar a paixão? Para
Henry James, ela vale a pena. Concordo. Uma boa paixão nos garante a vida.
Nem que seja por um dia. O resto fica para a insanidade.
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domingo, 16 de agosto de 2015
Ninho
Espero.
Desde a manhã, eu a espero numa angústia que se multiplica com as horas. Partiu
ao encontro de outro. Receio que não volte, que meu corpo não mais a seduza. É
quase noite, continuo nu, pronto para recebê-la. Passei perfumes que a
fascinam, preparei-lhe os pratos favoritos, conservo portas e janelas abertas,
busquei-a no jardim não sei quantas vezes, nenhum sinal. Espero. Cada vez mais
aflito, eu a espero.
Talvez esteja com medo de mim. Tentei
estrangulá-la, é verdade, apertei-a até a pele arroxear e julgá-la morta. Resistiu
ao assédio, lutou com bravura pela vida, recuperou-se – e descobri seu encanto.
Ódio e amor possuem origens comuns, frequentam
o mesmo espaço. Tal o nosso caso. Dividimos a carne e o sangue. Ela, mais
forte, manteve a personalidade; eu mudei, sem arrependimento. Desenvolvi
instintos, resgatei paixão pela fragilidade, gozei a dor. Descobri a ternura da
mãe pelo feto. Feto, afeto... Assustado com o comportamento, reagi. Esganei-a
de novo. Em meio à investida, seus olhos negros moveram-se em desordem,
afogados na tez de leite. A delicadeza me enfeitiçou, sucumbi por completo.
Desde então,
amo-a sem recaídas de assassino. Juntos dia e noite, incomoda-me apenas nas
madrugadas: não tolera a separação do sono. Ante a solidão e meu silêncio,
cutuca-me, à procura de penetração carnal. Acordo em sobressalto, logo me rendo
a seus requebros. Calam fundo, porém matam-me de prazer.
Hoje de
manhã, experimentei a dor do parto. De fato, ela nasceu. Rompeu-me as entranhas
sem pressa. Primeiro surgiram os olhos, depois a cabeça e o tronco. As asas
apareceram recolhidas, molhadas. O abdome emergiu por último. Livre para o
mundo, esfregou as patas e bebeu de meu sangue. Jamais fui tão feliz.
A pequena
larva tinha evoluído dentro de mim até culminar na mosca que eu contemplava
sobre a pele, ora verde, ora azul, com lampejos dourados, variáveis conforme o
ângulo da luz. Sua carne era minha carne. Diferençávamos apenas na forma. Com
olhar de incesto, admirei-lhe a beleza. Com orgulho de pai, quis exibi-la.
Tomei, num
momento fugaz, o choque da realidade: eu a havia criado na coxa, suportado a
gestação, parido. Estava louco. Louco. A consciência da loucura destroçou-me.
Ergui a mão, preparei o infanticídio, não consegui executá-lo. O instinto
maternal prevaleceu. Eu a adorava mais que a qualquer outro ser. Sim, éramos
um.
Por amor, decidi incubar seus ovos. Que
ela me usasse como bem entendesse, eu aceitaria o padecimento. Que tivesse
centenas de filhos, eu cuidaria de todos. Com a entrega, desejava apenas gerar
vidas, alimentá-las, eternizar o milagre.
Tentei acariciá-la, agachou-se, ameaçou
voar. Sim, deveria sair de casa, dar uma volta pela vizinhança, encontrar um
companheiro para fecundá-la. Só assim me tornaria ninho outra vez.
Com cuidado, muito cuidado, encostei o
indicador em sua cabeça. Galgou-o até a falange. Levantei-me devagar, abri a
janela, lancei-a ao espaço. Em êxtase, acompanhei-lhe o voo nupcial. Pela
primeira vez em setenta anos, senti-me útil ao mundo. Nunca é tarde, diziam com
razão os antigos.
Desde a manhã, espero. Angustiado, eu a
espero.
quinta-feira, 13 de agosto de 2015
O REI DA PICARETAGEM
Sempre que vejo falsos religiosos
pregando nas tevês com a maior cara de pau, penso nos 300 e tantos picaretas do
Congresso Nacional que um conhecido político certa vez afirmou existirem no Senado e na Câmara. Uns e outros são farinha do mesmo saco. Uns e outros me
remetem a Tartufo, um dos mais famosos personagens de Molière, o maior
dramaturgo francês.
Tartufo é, também, o nome da peça que ele protagoniza, das
mais encenadas do teatro. Tartufo é fingido, hipócrita, mentiroso, corrupto, chantageador,
desleal, falso religioso, interessado apenas em tirar dinheiro daqueles a quem faz
as mais devotas pregações.
A peça estreou em 1664, portanto há 351 anos, e
continua atualíssima. Provocou violenta reação do clero da época, ficando
proibida por alguns anos. Quem a visse ou encenasse foi ameaçado de excomunhão
pelo arcebispo de Paris.
Leia Tartufo para ver
como a canalhice não muda através dos séculos. Depois, ligue a tevê, escute atentamente os canais
religiosos com apelo financeiro, analise as técnicas de persuasão utilizadas,
em seguida compare os debates no Congresso com a verdadeira atuação, nos
bastidores, de deputados e senadores. O resultado é puro teatro, o teatro de
Molière, a falsidade de Tartufo até a exaustão. Uma tartufada sem fim.
Acontece
que Tartufo, no final da peça, é desmascarado. No Brasil, isso ainda está longe
de acontecer. Nossos Tartufos continuam depositários da moralidade. A cada dia
que passa, Molière estremece no túmulo por nós.
quarta-feira, 12 de agosto de 2015
O PAI DO DOM QUIXOTE
Existe unanimidade quanto ao
maior romance da língua espanhola : é o Dom Quixote, de Cervantes. Muitos também
o consideram o marco inaugural do romance moderno. Deliciosamente picaresco e
grotesco, Dom Quixote de la Mancha parodiou e criticou as histórias de
cavalaria.
Mas haveria, na literatura espanhola, um antecessor dele, um germe
que viesse a brotar com maior viço na cabeça de Cervantes? A resposta é sim. Há
alguns.
Um deles é “A vida de Lazarilho de Tormes”, publicado em 1554, quando
Cervantes tinha apenas sete anos. Com espírito picaresco e grotesco, Lazarilho
de Tormes é quixotesco meio século antes de Dom Quixote. Ninguém sabe quem o escreveu,
mas, pelas críticas que o pequeno livro faz, era um erudito, bem informado
sobre as mazelas da época, sobretudo as da Igreja católica, principal vítima do
autor.
No entanto, é na sátira à cavalaria que os dois livros mais se aproximam.
Lazarilho serve a um escudeiro que tem o perfil de Dom Quixote, inclusive em
algumas imagens que lhe são agregadas, como a triste figura, a sorte adversa, a
defesa da honra, a falsa nobreza. O próprio Lazarilho, com seu apego à
realidade, é um rascunho de Sancho Pança.
Isso mostra que, por mais originais
que julguemos os autores, nenhum escapa às influências de seus antecessores. No
entanto, alguns, através de seus temperos exclusivos, linguagem elaborada, metáforas
incomuns e genialidade própria, levam a fama. Shakespeare que o diga. Desculpe
o lapso. Cervantes que o diga.
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terça-feira, 11 de agosto de 2015
SOBRE O QUE ESCRITORES FOFOCAM?
Sempre me perguntam, durante uma festa, sobre que assuntos
os escritores conversam em seus encontros. A pergunta, na verdade, é outra.
Querem saber se falamos apenas de livros. A resposta é não. Como qualquer
outro grupo, falamos de tudo, com especial predileção pelos amigos ausentes. Ai
dos ausentes. Sim, com frequência quem não está na roda entra na roda. A gente tem permissão. Como
escritores costumam ser bons observadores, conhecem bem os detalhes da vítima, põem depressa a
mão inteira na ferida.
Mas nem tudo é má-língua. Também fazemos elogios. O
problema é que alguns colegas não dão motivo. Dia desses, tivemos uma boa
razão para elogiar, e o fizemos. Um sisudo romancista, no auge da capacidade
criadora, resolveu surtar no meio de um bar e incorporou uma pomba-gira ou um
diabo, sei lá. A interpretação, de tão convincente, arrancou aplausos de toda a
roda, com seguidos pedidos de bis, prometido para breve. Esse autor/ator deve
estar gestando um personagem meio endemoninhado. Só pode ser isso. A outra opção é pior.
Mas a resposta também pode ser sim. Sim, falamos de literatura. Assim como gostamos de escrever,
também gostamos de ler. Muito. Discutimos, por horas, às vezes com veemência, nossas preferências. Na semana passada, recebi uma ótima dica de leitura. Um
ficcionista de primeira aplicou-me o norte-americano Cormac MacCarthy, autor
que explora a violência em seu limite. Escorre sangue de suas páginas.
Recomendou-me o romance Meridiano de Sangue, obra-prima de MacCarthy. Já estou conferindo.
Para amenizar nossos encontros, como os de qualquer outro grupo, contamos piadas. Afinal, quem resiste a uma boa piada?
Dizem que a vida é a maior delas. Verdade ou mentira? Bom assunto para puxar no
próximo encontro com escritores. O riso é sempre a coroação de
um bom papo.
segunda-feira, 10 de agosto de 2015
BEBER LITERATURA
Uma destas, a do Trinity College, oferecia mais de 200.000 volumes já no século 18, e a sala de leitura mede mais de 70 metros de comprimento. A gente se perde entre as prateleiras. O grande tesouro irlandês é também um livro, o chamado Book of Kell´s, um pergaminho dos Evangelhos com mais de 1000 anos, coberto de belas iluminuras. Uma obra de arte admirável.
Num ambiente desses, não é de se estranhar que a Irlanda tenha tantos grandes autores, a começar por James Joyce, ícone do século 20, conhecido sobretudo por seu romance Ulisses. Sem falar, é claro, em Dublinenses.
Mas também eram irlandeses Jonathan Swift, Oscar Wilde, Bernard Shaw, Samuel Beckett, o poeta Yeats e o também poeta Seamus Heaney, extraordinário, por sinal, ganhador do prêmio Nobel em 1995.
Por falar em Nobel, a pequena Irlanda, com menos de 7 milhões de habitantes, coleciona 4 em literatura. A tradição se traduz nos prêmios. De fato, não apenas em Dublin, mas em toda a Irlanda, se bebe literatura. E, junto, muita cerveja. Combinação perfeita.
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domingo, 9 de agosto de 2015
Entre a razão e a emoção, com qual você fica?
O
que nasceu antes, a razão ou a emoção? Se você respondeu a emoção, acertou. A
emoção precede a razão. Quanto mais desenvolvemos as emoções, melhor
raciocinamos. Muita gente sabe isso por instinto, mas faltava comprovar cientificamente.
A comprovação foi feita por neurocientistas nos Estados Unidos, na Europa e
aqui no Brasil.
Agora, faço uma provocação: o que é a literatura senão pílulas concentradas de emoção?
Dessa simples pergunta, conclui-se que quem lê bastante ficção raciocina
melhor. Isso de fato acontece. Outro estudo sobre o cérebro explicou o motivo.
Nossa mente não distingue bem a diferença entre a realidade e a fantasia
escrita nos livros. Para o cérebro, são quase a mesma coisa o enredo de um
romance e um episódio que estivéssemos de fato vivendo. Resultado: aprendemos
muito com a fantasia, o que nos ajuda a raciocinar melhor.
Como
se essas vantagens já não bastassem, a leitura ainda lubrifica as estradas de
neurônios que produzem os pensamentos, transformando-as em verdadeiras
autopistas de grande velocidade. Tanto é verdade que, num estudo recente, constatou-se
que os analfabetos e os pouco letrados não ganham o benefício da agilidade dos
impulsos neuroniais.
Uma
pena que isso aconteça. Como se vê, o analfabetismo é duplamente cruel com as
pessoas, social e mentalmente. Resumindo a questão: se você quer maior rapidez
de pensamento busque o entretenimento. O entretenimento da leitura. Ninguém sai
o mesmo de um bom livro.
sexta-feira, 7 de agosto de 2015
TRAVESSIA DOS ANDES: DESAFIO NA NEVE
Imagine uma cordilheira dentro de
outra, mãe e filhote. Imagine o filhote com dezenas de picos nevados a mais de
cinco ou seis mil metros de altitude, agrupados num perímetro de apenas 165
quilômetros. Isso existe? Sim, existe. Existe no meio dos Andes peruanos, está
separada do maciço central, tem características próprias e se chama Huayhuash. Atravessá-la
é um desafio radical. Num único dia, saí de uma densa mata de quenuales a três
mil e quinhentos metros de altitude, cheguei à neve a cinco mil e dormi a
quatro mil, na puna andina. Encontrei por lá gente de trinta países, nenhum
brasileiro. Ainda não descobrimos o lugar.
Huayhuash é uma aventura que marca não
apenas pela beleza, também pela diversidade de clima, de relevo, de plantas e
animais, pelos lagos cristalinos, pelo estrondo das avalanchas, pelo silêncio
da noite, pela pureza do ar, pelo vento que arrasta e congela. Nem pense em ir,
se você gosta de conforto. Barraca é o único hotel. Estrelas, o triplo das que
vemos em nossas cidades, são o cobertor.
Huaywash tem o som, em inglês, de “why
wash?” ou “por que se lavar?”. Ao percorrer suas trilhas, em média doze dias,
é difícil tomar banho. Os riachos que descem das geleiras não nos convidam para
mergulhos. De tão frios, trazem risco de hipotermia. Na única fonte termal que
encontrei, ao pé de um vulcão, tive a companhia de uma nevasca que me roubou a
coragem de sair do poço. Punha a cara fora da água, o cabelo congelava, e eu mergulhava
de volta no quentinho.
Belas montanhas com nomes sonoros e
estranhos compõem a paisagem, brancas de doer ao sol: Yerupajá, Jirishanca,
Ninashanca e Siula. O Siula, aliás, foi palco da façanha relatada no livro “Tocando
o vazio”, prova da enorme capacidade de resistência do ser humano.
Huaywash, de tão remota e selvagem,
foi esconderijo do Sendero Luminoso, o famoso grupo guerrilheiro peruano.
Sendero Luminoso, ou Caminho Luminoso, seria um nome apropriado para a
cordilheira. Ali se veem todas as possíveis nuanças de luz, sobretudo aquela
que, lá no alto dos cumes, onde o ar rarefeito embevece o cérebro, parece
brotar de dentro da gente e iluminar o presente, o passado e o futuro,
revelando a imensa curtição de estar neste mundo. À luz de Huayhuash, a vida
pulsa através de todos os tempos num único momento. Um eterno momento. Quem
resiste a lugar desses?
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quinta-feira, 6 de agosto de 2015
QUEM TEM MEDO DE UM ATEU?
Há alguns escritores que, pela competência,
permanecem bem vivos na literatura depois que morrem. Outros, ainda mais
importantes, ficam pela competência e pela coragem.
Tal foi o caso do inglês Bertrand Russell, prêmio Nobel de Literatura em 1950, autor que deixou uma vasta obra, sem falar em sua atividade pacifista e no fato de ele ter sido um dos grandes matemáticos do século 20.
Um dos livros mais conhecidos de Bertrand Russell é Por que não sou cristão, onde ele aponta os motivos pelos quais não acreditava nas promessas do cristianismo e, mais além, expõe por que defendia o ateísmo.
Russell, grande lógico que era, destrinça os argumentos usados para as defesas do cristianismo e de Deus e chega a conclusões arrasadoras, tão arrasadoras que muito se escreveu contra ele. Muito mesmo. Alguns de seus debates foram antológicos. Os adversários se calaram.
Imagino que, mesmo nos dias de hoje, um escritor brasileiro teria dificuldade de publicar aqui, em primeira mão, um livro tão contundente quanto Por que não sou cristão, em função de nossas tradições religiosas. Acontece que o livro se baseia numa palestra feita na Inglaterra em 1927, portanto há quase 90 anos. Provocou uma grande comoção ao sair, mas os ingleses bancaram a independência intelectual de Russell, assim como haviam feito com Darwin.
Talvez essa independência ajude a explicar por que tenhamos ficado no banco de trás, por tanto tempo, no bonde da história. Nos dias de hoje, em que o rancor religioso é pregado abertamente por determinadas seitas no Brasil, em que supostos "guerreiros de Jesus" conclamam para guerras santas, os alertas de Bertrand Russell soam absolutamente atuais. Vale a pena conhecê-los, independentemente da crença. Ateus não cobram dízimo quando tentam ajudar.
Tal foi o caso do inglês Bertrand Russell, prêmio Nobel de Literatura em 1950, autor que deixou uma vasta obra, sem falar em sua atividade pacifista e no fato de ele ter sido um dos grandes matemáticos do século 20.
Um dos livros mais conhecidos de Bertrand Russell é Por que não sou cristão, onde ele aponta os motivos pelos quais não acreditava nas promessas do cristianismo e, mais além, expõe por que defendia o ateísmo.
Russell, grande lógico que era, destrinça os argumentos usados para as defesas do cristianismo e de Deus e chega a conclusões arrasadoras, tão arrasadoras que muito se escreveu contra ele. Muito mesmo. Alguns de seus debates foram antológicos. Os adversários se calaram.
Imagino que, mesmo nos dias de hoje, um escritor brasileiro teria dificuldade de publicar aqui, em primeira mão, um livro tão contundente quanto Por que não sou cristão, em função de nossas tradições religiosas. Acontece que o livro se baseia numa palestra feita na Inglaterra em 1927, portanto há quase 90 anos. Provocou uma grande comoção ao sair, mas os ingleses bancaram a independência intelectual de Russell, assim como haviam feito com Darwin.
Talvez essa independência ajude a explicar por que tenhamos ficado no banco de trás, por tanto tempo, no bonde da história. Nos dias de hoje, em que o rancor religioso é pregado abertamente por determinadas seitas no Brasil, em que supostos "guerreiros de Jesus" conclamam para guerras santas, os alertas de Bertrand Russell soam absolutamente atuais. Vale a pena conhecê-los, independentemente da crença. Ateus não cobram dízimo quando tentam ajudar.
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