sexta-feira, 12 de junho de 2015

A arte de caçar lobisomem


          Você procura um livro com humor requintado, que o faça chorar de rir, contenha belas imagens e ofereça deliciosos achados linguísticos, porém sustente a fluidez que o leve, num susto, da primeira à última página? Você busca um personagem de carne e osso, que a gente acredita ser real, um personagem que gerou muitos filhos em nossa literatura, televisão e cinema? Pois então leia o romance O Coronel e o Lobisomem, de José Cândido de Carvalho, e deleite-se. Este autor escreveu pouco, mas, caramba, com que competência. O Coronel e o Lobisomem, por si só, ultrapassa em criatividade muitas extensas bibliografias.
          A obra aborda a vida, as aventuras e desventuras, neste e no outro mundo, do coronel Ponciano de Azeredo Furtado, coronel por trabalho de valentia e senhor de pasto por direito de herança, dono de um sabiá-laranjeira que valia mais que as pratas e os ouros do maior sultão das Arábias. Do alto de seus dois metros de altura, orgulhoso dos feitos e do nome, ele metia medo em suas terras e nas cidades vizinhas, graças ao porte físico e ao vozeirão. Usava e abusava dessas vantagens, era bondoso à sua maneira, mas tinha o miolo mole. Deixava-se arrastar por um rabo de saia e vangloriava-se das tantas virgens que deflorou ou das maldades que praticou. Além disso, gostava de matar onça-pintada.
          Ponciano era politicamente incorreto, tanto no comportamento, como no linguajar e no tratamento dado às pessoas. Hoje, poucos escritores se atreveriam a pôr, na boca e nos pensamentos de um personagem, palavras tão abusadas, para não cair nas garras dos censores de plantão e de sua falsa moralidade. Pois o que faz o coronel mais autêntico, mais marcante, mais carne e osso, é justamente a falta de travas na língua, o jeito desengonçado de expor as ideias esdrúxulas, de dividir sua experiência de vida e sua rusticidade. Ponciano encarna o poder decadente da aristocracia rural brasileira e luta para manter as aparências. Ele sai das páginas de O Coronel e o Lobisomem com a força que o lobisomem marca a imaginação de tanta gente. E marca nossa memória com garras de onça selvagem. Ou de lobisomem, tanto faz. É ler e gostar. 

2 comentários:

Anônimo disse...

Este livro é MA-RA-VI-LHO-SOOOOOOOOOOOO!!! Amo de paixão!! Beijos, primo, Carla Giffoni

BlogdoLuísGiffoni disse...

Eu também acho. Uma beleza. Dos melhores momentos de nossa literatura. Bjs