terça-feira, 7 de julho de 2015

ECOLOGIA DE QUINTAL

     Só me dou conta do limoeiro do quintal quando os amigos elogiam seus frutos. Dizem que são os mais suculentos que conhecem. Claro, trata-se de doce gentileza. Amigos se excedem em amabilidades mesmo nos mais amargos assuntos.
     Numa tarde dessas, observei que as folhas da árvore estavam amarelando, talvez por falta d’água. Abri a mangueira, comecei a molhá-las. Sem cerimônia, dois sebinhos apareceram para matar a sede e tomar banho. Num canto, um sabiá ressabiado preferiu se fartar com as gotas que escorriam. Um beija-flor preto-esverdeado, à maneira de animais de circo que saltam através de aros, cruzou o jato em sua parte mais alta, numa curtição de dar inveja.
     Notei que os pássaros vivem ao redor do limoeiro. Por quê? Examinei a árvore de perto. Formigas de diferentes espécies andavam pelo tronco em ritmo de dia de semana no centro da cidade, embora fosse domingo, o que me mostrou como a natureza passa muito bem sem os conceitos humanos. Algumas delas se alimentavam de uma secreção oriunda do dorso de pulgões, uns bichinhos miúdos demais para a produção de tanto líquido. Verdadeiras vacas na ordenha. Deviam trocar o leite por proteção.
     Junto às flores, outros pulgões se apegavam às pétalas, em tal quantidade que formavam manchas negras. Não ligavam para as abelhas com as patas douradas de pólen. Marimbondos, dos pequenos e dos cavalos, zuniam sem saber onde pousar. Numa teia, debatia-se um inseto geométrico, perfeito losango vivo. Uma aranha o rondava para banquetear-se. Taturanas e centopeias passeavam pela ramagem coberta de líquen, aparentemente perdidas. Sob uma folha, um inseto envolto por fios brancos, miniatura de porco-espinho, tecia seu casulo.
     Descobri por que os pássaros ficavam por ali. Era seu mundo, pequeno, com regras peculiares, e eu o flagrara no dia a dia. Embora restrito ao meu quintal, esse mundo se submetia às velhas leis da natureza. Ampliei a escala da observação. O planeta é um limoeiro gigante, no quintal de todos: os seres vivos respiram o mesmo ar, retiram da terra seu sustento, a ela tudo devolvem. Estamos no mesmo pé. A única diferença talvez seja a consciência, que produziu em mim um sentimento de irmandade com as plantas e os animais.
     Ao me ver integrado à imensa engrenagem da vida, não contive o encantamento. Eu jamais ficaria sozinho no mundo. Era tudo – e tinha tudo em mim. Ninguém encara um limoeiro  impunemente.

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